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terça-feira, 11 de janeiro de 2022

zo´é, a vida

Essa é pra não dizer que não falei das flores, mesmo com espinhos. Hoje não desanco o Inominável a não ser em filigrana.

Quero falar de uma coisa, onde é que ela anda? Anda pelos montes e matas, e seu nome é Zo´é. Sim, como "vida" em grego só que com uma apóstrofe no meio. É uma etnia amazonense, nação contactada há poucos anos. Mas algum língua percebe o idioma que falam e conseguiu que entendessem a necessidade de se vacinar. O posto da FUNAI mais próximo ficava a dois dias a pé. Menos, talvez, para quem tivesse boas pernas. Se o jovem de 24 anos na época levou esse tempo, é porque carregava às costas o seu pai, portador de alguma deficiência temporária ou não que não permitia que fosse sequer amparado pelo caminho. Como Enéas, mas em vez de fugir, buscava, e chegou. Sendo filmado pelo funcionário que o atendeu em seguida, comovido, e por motivos não revelados pela BBC só um ano depois liberou o vídeo.

Essa foi a flor; os espinhos são a má adaptação de não poucas etnias à nefasta vizinhança do mundo moderno. Sem nem mencionar o óbvio, o desmatamento, a evangelização (essa recedeu um tanto com a saudável reação de alguns povos e chefes à política oficial recente), o alcoolismo. Incomoda muito a dependência dos remédios "da cidade" para males que não o são.

Em 2000 conheci no Museu do Índio em Botafogo uma vovó Terena que se queixava de alergia ou micose nos braços. Reclamava que no posto não davam remédio. Como é possível, vovó, perguntei, que a senhora na sua terra não conheça nenhuma erva? E como dizia não haver nenhuma, fui comprar babosa ali do lado, aloés para os pouco ligados em nomes populares; e lhe passei também o meu frasquinho de florais que então costumava carregar. Devia haver alguma essência de limpeza, não lembro. Uso meus florais mas não os carrego mais pra uso alheio, porém essa vez o hábito me valeu. O vermelhão foi desbotando e a coceira sumindo mas a vovó gostou mesmo foi dos florais, que ganhou então de presente.

Muito bonito mas que triste que ninguém na aldeia Terena soubesse tratar a vovó, que dirá ensinar ervas curativas aos vários jovens que a acompanhavam. Não precisava ser a babosa que inclusive não é nativa. Não se deve usar como bengala a farmacopéia oficial , quando se tem, como o filho dedicado do povo Zo´é, boas pernas para andar.

Dedico essas considerações ao grande Aílton Krenak e que possa sugerir formas de fugir desta substituição deletéria de valores.

E como dizem os irmãos do candomblé, Ko si ewé kosi orixá, sem folha não há santo.



Um comentário:

carlos de hollanda disse...

Kosi ewé kosi orixá...
Sigo e trabalho no Espiritismo mas o Candomblé me fascina!
É Natureza, ancestralidade, pureza, belo e poético!