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domingo, 15 de agosto de 2010

O sertão de Omolu

O inglês médico cujo livro já citei aqui duas vezes (está de bom tamanho a propaganda grátis... é aliás leitura fascinante) não gosta mesmo de acupuntura. Definiu a medicina chinesa como “terapêutica de tradicional e fútil feitiçaria” mas na hora de comentar a varíola, ou bexigas, deu o mindinho a torcer (o braço todo, não) lembrando que os antigos chineses “talvez já empregassem” uma forma de prevenção da doença. Ora, ela é atestada por gravuras comentadas, que Sidney Chalhoub reproduziu em Cidade Febril.
Certas regiões da África usavam método parecido, inalando o pó seco das bexigas para a manifestação ser branda. O pouco saudoso Cotton Mather, o que preconizava o extermínio dos indígenas, teve um escravo, Onesimus, que lhe contou. (Não li Cotton Mather não, li Sidney Chalhoub...) Graças a esse Onésimo, e à diligente pena de seu amo, sabemos da prática mas infelizmente não da região, que Mather não anotou. A isso se chamava variolização.
Menina, ainda conheci caras furadas de bexigas, como de um professor na casa dos 50, e não tinha sido das piores a virulência, concluo hoje, porque tinha os furos mas não os calombos. Quem contraísse junto ao gado a febre benigna chamada vacina (de “vacca” em latim) não desenvolvia varíola. É famosa a descoberta de Jenner junto à leiteirinha inglesa, que não temia a varíola porque tivera vacina. E daí hoje o temível flagelo está dado por extinto.
Um dos motivos que faz de Omolu um santo tão temido é a sua associação com as bexigas, cujas bolhas replicam os grãos de cereal. Assim, é ligado à vida e à morte, que são uma a condição da outra. Até o nome nagô da cerimônia para ele espelha isso, podendo significar “a comida do Senhor” como “o Senhor da destruição”. Qualquer manifestação que afete a pele lhe diz respeito. A energia desse orixá vibra na nossa bexiga e área sacral (segundo chacra pela maioria das escolas) e não custa lembrar que o meridiano da Bexiga é o mais longo, percorrendo do olho ao artelho menor e fazendo percurso dobrado nas costas, expandindo o caminho da saúde como da doença. Pois Omolu é também de cura. Ao ponto ouvido por Edson Carneiro e Bastide, reproduzido por Chalhoub, “Omolu vai pro sertão, bexiga vai espalhar, ele mesmo é nosso pai, é quem vai nos ajudar” podemos acrescentar o ...se meu corpo está ferido a ele vou recorrer, ele é meu pai Obaluaiê. Atotô!

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